Em depoimento, filha de suspeita de envenenar enteados diz ter visto líquido esverdeado em prato
A filha de Cíntia Mariano – a madrasta suspeita de ter envenenado os dois enteados –, Carla Mariano Rodrigues, prestou depoimento na sexta-feira (20), na 33ª DP, em Realengo, e contou que havia algo estranho com o feijão de Bruno Cabral, o jovem de 16 anos que passou mal, foi internado, mas sobreviveu.
Para o delegado Flávio Rodrigues, que cuida do caso, Carla contou que reparou em Bruno separando a comida, e que a mãe dela perguntou se ele queria trocar o prato. Na sequência, pegou o prato do jovem, colocou mais feijão e devolveu para ele comer.
“A declarante viu no prato de Bruno um líquido esverdeado escuro e brilhoso no fundo do prato, mas na hora não viu relevância nenhuma por acreditar ser tempero da comida”
Jovem que morreu ingeriu banana com granola
O depoimento traz ainda impressões de Carla no dia em que Fernanda Cabral, que morava com ela e sua família, passou mal. Ela revela que a jovem de 22 anos começou a sentir-se diferente depois de comer uma banana com mel e granola.
“Em relação a morte de Fernanda, a declarante sabe informar que a mesma passou mal após fazer um lanche. Que Fernanda não comia a mesma comida que todos na casa, pois fazia dieta. Que Fernanda fez um lanche (banana com mel e granola) e em seguida foi deitar. Foi quando começou a passar mal. Que Fernanda falou que estava passando muito mal, que não estava enxergando e que as pernas estavam muito pesadas”, diz outro trecho do documento.
O delegado Flávio Rodrigues também já ouviu o depoimento do médico que atestou o óbito de Fernanda Cabral, mas este foi pouco esclarecedor, já que o profissional disse que apenas ajudou uma colega sem carimbo a assinar o documento de morte da jovem.
Intoxicação do outro filho levantou suspeitas
As suspeitas sobre a morte de Fernanda Cabral no dia 27 de março – cuja morte foi atestada como sendo por causas naturais – , só surgiram quando o irmão dela, Bruno, de 16 anos, começou a passar mal depois de um almoço na casa da madrasta, no dia 15 de maio.
No local, ele reclamou de ter recebido um feijão amargo e com algumas pedrinhas azuis. Em casa, com a mãe, e já se sentindo mal, falou sobre o alimento.
No hospital, Bruno foi submetido a uma lavagem estomacal e a um exame de sangue que detectou níveis altos de chumbo em seu sangue.
Com a suspeita de que os filhos foram envenenados, Jane Carvalho Cabral, mãe dos jovens, registrou queixa na 33ª DP, em Realengo, que iniciou buscas na casa da madrasta.
A coincidência levantou suspeitas, gerou registro de ocorrência e investigação na 33ª DP, em Realengo.
“Ele já veio de lá com uma ansiedade, bem preocupado e achando que tinha acontecido algo estranho porque quando reclamou do feijão amargo de pedrinhas azuis, ela arrancou o prato da mão dele, colocando mais feijão e entregando pra ele depois. Quando ele veio pra cá, veio perguntando como fazia pra vomitar. Mais ou menos uns 40 minutos depois, começou todo o desespero que foi o que a Fernanda sentiu. Na mesma hora eu imaginei que o gosto amargo desse feijão poderia ser o suposto veneno”, contou a mãe dos jovens.
Cíntia Mariano foi presa, teve sua prisão temporária de 30 dias confirmada pela Justiça e espera as investigações sobre o caso se desenvolverem.
Investigações
O delegado trabalha com o depoimento de Bruno – que contou sobre o feijão amargo e com pedrinhas azuis – e com a fala de um filho biológico de Cinthia: ele disse que a mãe confessou ter envenenado os enteados.
A polícia também analisou o feijão da casa de Cíntia. O resultado não apontou nenhuma substância tóxica. Mas a investigação não considerou a análise conclusiva, já que o feijão pode ser diferente do que Bruno comeu.
O delegado Flávio Rodrigues também pediu a análise de um remédio antipulgas encontrado na casa. Ele ainda vai se debruçar sobre o prontuário médico de Fernanda Cabral, com mais de 170 páginas, e espera interrogar os médicos que atenderam a jovem nos próximos dias.
Uma exumação do corpo de Fernanda, que teve a morte atestada por causas naturais na época, acontece nesta quinta-feira (26).
Madrasta tentou se matar
Com a denúncia do caso, investigadores foram até a casa de Cíntia e recolheram o feijão para análise, mas antes do resultado do exame, na quinta-feira (19), a madrasta tentou se matar.
Ela foi levada para o hospital, se recuperou e, na sexta-feira (20), foi levada para a 33ª DP para prestar depoimento, quando teve sua prisão decretada.
A análise do feijão não encontrou substâncias tóxicas, mas polícia não tem confirmação se é a mesma comida ingerida pela vítima.
“A prisão temporária de 30 dias foi decretada por homicídio tentado, qualificado, com emprego de veneno. Tudo leva a crer que a motivação seria ciúmes do relacionamento do marido com os filhos naturais”, disse o delegado Flávio Rodrigues, titular da 33ª DP.
Madrasta teria confessado crime ao filho
Na delegacia, Cíntia se manteve em silêncio, seguindo orientações do advogado. Mas em outro depoimento, um filho biológico de Cíntia contou à polícia que a mãe confessou ter envenenado Fernanda e Bruno com chumbinho, que é veneno usado para matar ratos.
“Uma mulher dessas não pode nem ser chamada de ser humano, isso é um monstro. Essa pessoa entrou na nossa vida quando meu filho tinha 4 anos de idade. Fazer isso com a irmã e depois fazer com meu filho, isso não é um ser humano, não é um ser humano”, disse Jane Cabral, mãe dos jovens.
O advogado Carlos Augusto Santos, que representa a suspeita de envenenar os dois enteados com chumbinho no feijão, num intervalo de dois meses, disse que sua cliente se “declara inocente” e que “em nenhum momento informou ou confirmou o fato”.