Campos perde o médico Francisco Lacerda
Morreu em Vitória, no domingo (17), o cirurgião-ortopedista Francisco Almeida Lacerda. Ele se recuperava de uma segunda cirurgia na coluna, tendo a primeira ocorrido há uns seis anos, em São Paulo. Deixa um histórico de quase 60 anos dedicados à medicina e os conhecimentos de incansável estudioso da profissão que lhe conferira singular reputação.
Deu os primeiros passos na Santa Casa, tendo percorrido os principais hospitais e clínicas de Campos, com destaque para a Beneficência Portuguesa e Álvaro Alvim.
Foi fundador e um dos proprietários da Clínica Santa Helena, tendo atuado, ainda, como médico e diretor-clínico do Hospital Geral Dr. Beda.Benemérito do Americano Futebol Clube – uma de suas paixões –, Lacerda foi um dos secretários de Saúde mais vanguardistas e competentes do município, sendo sua gestão sido responsável por importantes avanços na Saúde Pública de Campos, quer na questão organizacional quer, principalmente, no atendimento ao público.
Ensinamentos – Não posso deixar de registrar, foi um dos homens com quem muito aprendi, em longas conversas sobre os mais variados temas, face a seu largo conhecimento acerca de assuntos os mais distintos. A diferença de idade de cerca de 20 anos não representava nada.
Ao contrário, tinha clareza do quanto Lacerda estava tanto mais antenado sobre a vida e o mundo do futuro, quanto de passado mais distante – particularmente das coisas de Campos – sobre as quais com ele muito aprendi.
Confesso, não é fácil escrever sobre o homem que me deu a honra de ser amigo, com quem tantas vezes saí para jantar, que fiz três ou quatro entrevistas – a última aqui no J3News – e com quem fizemos algumas viagens para Meaipe, Iriri e Vila Velha.
Contato – Há cerca de 25 anos, o resultado da minha imprudência de, ‘besuntado’ de bronzeador, ter saltado alguns degraus da área de lazer do advogado Carlos Alberto Senra, em São Francisco, foi a fratura do tornozelo em dois lugares. Coube a Murilo Dieguez – amigo de todas as horas – me trazer para Campos visto que queria ser consultado por dr. Luiz Carlos Lins. Mas Lins, cunhado de Francisco Lacerda, estava de viagem marcada e ‘me passou’ para Lacerda.
O caminho natural seria cirurgia, mas eu, medroso, fiz um escândalo na Santa Helena e Lacerda, sensível, disse: vou recuar 30 anos na Medicina e fazer o tratamento conservador.
Durou três meses. Quase todas as semanas Lacerda passava lá em casa. Acompanhava com severidade se não estava abusando e após esse longo período, tudo ficou 100%, sem cirurgia. Na hora de apresentar os honorários (ainda não era meu amigo), disse: nada. Surgia ali uma amizade forte, passando a ser médico de minha mulher e até de amigos que ‘encaminhava’ para ele.
Legado – Só hoje (18), soube de sua morte. Nos últimos anos Lacerda dividia seu tempo entre Campos e Vila Velha, onde já residia seu filho mais novo, Filipe. Não gostava muito de celular e a distância acabou nos afastando um pouco. Mas estava devendo uma visita que acabei não fazendo.
Escrevo de cabeça e certamente muita coisa está passando em branco. Seu legado é extenso e em várias frentes. Além de médico, era um historiador nato – conhecia do município como poucos –, bem como de história geral.
Muito culto, o homem de aparência sisuda era, na verdade, uma pessoa sensível e afável. Certa vez me contou de uma moça que sofria de grave doença e, após várias cirurgias, apareceu no corredor da Santa Casa andando normalmente. Ao recordar o fato, não segurou as lágrimas.Leitor voraz, amante da natureza, exímio pescador, fez dezenas de viagens com seu jeep Bandeirante para o Pantanal de Mato Grosso. Era um cosmopolita com os olhos na vida rural.
A Medicina perde uma de suas referências. Eu perdi um amigo e não fizemos a viagem ao Uruguai que combinamos. Enfim…Meus sentimentos à irmã, Eliane – pessoa de fino trato –, ao dr. Lins, a seus filhos e à mulher Graça.
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